O elemento família habita a filmografia dos irmãos Dardenne há pelo menos dez anos, e é interessante que “O Garoto da Bicicleta” acabe buscando toda sua força justamente na ausência de uma. Trazendo uma narrativa centrada em um garoto de infância problemática mas compreensível, o filme também resgata qualidades que me fazem lembrar de “Os Esquecidos” e “Ladrões de Bicicleta”. 

 

Cyril foi deixado pelo pai em um orfanato, este lhe prometeu que voltaria para buscá-lo tão logo tivesse acertado sua vida pessoal, que se complicara após a morte da avó do garoto. No entanto o tempo passa e o pai nem aparece, nem tenta estabelecer qualquer tipo de contato, ele sumira sem deixar qualquer informação sobre seu paradeiro. 

Ao externar a tristeza pelo afastamento de seu pai, o jovem Cyril Catoul – interpretado de forma magnífica por Thomas Doret – expressa toda a fúria e frustração da forma mais intensa, violenta e descontrolada possível. As emoções mais agressivas e viscerais vêm à tona sem qualquer tipo de freio.

Ele quer encontrar e ser aceito pelo pai. E nada, nem ninguém, pode ficar no seu caminho. Por isso, Cyril é grosseiro, indisciplinado, agressivo e incontrolável. Um desafio para os educadores que trabalham no internato onde está trancado há um mês. Um teste pesado no exercício de tolerância e amor posto em prática pela cabeleireira Samantha (Cécile de France).

Logo no início, os dois se encontram de forma acidental, quando Cyril tenta entrar no apartamento do seu pai. Há uma identificação entre ambos quando Samantha devolve ao jovem a bicicleta que lhe havia sido roubada – único símbolo da união paterna que lhe restou. Os dois – o jovem e a mulher – passarão a se ver nos fins de semana.

Todo o desenvolvimento do filme é feito de maneira muito sensível e rica, pois podemos assim entender e sentir na pele os dramas dos personagens. A forma como tudo foi conduzido não nos deixa de levar a odiar ou amar alguns deles, mas ao menos nos torna claro e evidente os motivos e justificativas de cada um ao tomar determinadas ações. O medo de Cyril após o abandono é o que realmente rege a obra e é muito bem representado pelo ator Thomas Doret e sua mãe adotiva está muito bem representada por Cécile de France, que apareceu ano passado no longa “Além da Vida“.

A bicicleta mencionada no título da obra serve como simbolismo para o retratar a sensação de liberdade de um garoto retraído e sem grandes expressões. O mundo não foi fácil para ele e andar em sua companheira é aquilo que lhe é mais atrativo. Ele não tem amigos e quando faz amizade, termina sendo com alguém que não vale a pena. Suas ações são instintivas e seu aprendizado será com o mundo, que lhe fará errar e aprender com seu erro.

 

 

Este é o roteiro mais inteligente dos irmãos diretores desde “A Criança”, de 2005. Através dos problemas de Cyril e a forma com que lida com eles, o filme faz um paralelo com as vidas e decisões de vários outros personagens. Principalmente em seu clímax, “O Garoto da Bicicleta” é competente não a deixar o julgamento do caráter dos personagens, mas ao deixar claro que nenhum julgamento deve ser feito. O filme é curto e o ritmo é bom, apesar de tipicamente francês.

 

Post Anterior:

[ESPECIAL] – O Lado Bom da Vida

Não deixe de conferir as novidades do CineOrna através das nossas redes sociais:

Facebook | Twitter | Filmow | G+ | Instagram | Tumblr | Pinterest