É um tanto estranho ver Will Farrell surgir em “Tudo Por Um Furo” tão seriamente confortável com a posição de coadjuvante de si mesmo. Quase sem referência ao legado deixado por “O Âncora”, a sequência da lenda de Ron Burgundy, o inconveniente âncora de um jornal local, parece assumir o humor como obrigação e a sátira como preenchimento de vácuo, num exercício narrativo que pouco faz jus a originalidade de Adam McKay e Farrell quanto autores (por mais que gostaria de achar que tudo aqui é intencional) e que serve somente de afirmação do quão definitivo é “O Âncora” para o gênero. Partindo da premissa de que “Tudo Por Um Furo” compreende uma necessidade em conquistar a empatia dum (novo) público alvo, através de esquetes ágeis, sem se preocupar muito com o desenvolvimento particular dos personagens, essa versão empobrecida do original, na ideia da continuação da lenda de Ron Burgundy, sofre principalmente pela facilidade das piadas e a obviedade na qual a ação se desenvolve juntos delas, num estilo autoconsciente sem qualquer sutileza.

Se lá em “O Âncora” existia na forma e estilo com o qual McKay e elenco trabalhavam o humor goofy e o absurdismo a auto paródia e a sátira consistente de estereótipos categóricos, que Farrell traçava com genialidade ímpar a cada ação inconsequente de Ron Burgundy, aqui parece que seu personagem é domesticado pelo pouco tempo de brilhantismo em cena. Repleto de coadjuvantes, que infelizmente acabam não ajudando em nada no argumento e são apenas alívios cômicos pro elenco principal usar como ferramenta de back-up, o humor se mune de piadas recicladas e incontáveis sequências onde Steve Carell faz uma versão fácil de seu personagem em esquetes pontuais ao lado de Kristin Wiig, que surge afetada de combinações de personagens seus do Saturday Night  Live, e que mesmo arrancando algumas risadas pela naturalidade com a qual conduzem tais cenas, não é nada que já não tenhamos visto antes. Levando em conta a expectativa do filme em relação a seus coadjuvantes e essencialmente a volta de Ron Burgundy e sua trupe, e o desapontamento  que é esta sequência, é importante salientar que Adam McKay continua sabendo controlar os excessos e o humor como ninguém, diluindo as cenas em texturas que elevam tanto o texto quanto os atores em posições quase imaculadas dentro do filme. Poucos diretores do clã-Apatow souberem compreender, experimentar e se divertir tanto com o ato de subversão ou a idealização de um mito emblemático como McKay, não sendo a toa que a parceria do diretor com Will Ferrell rendeu mais de uma década.

 

 

Mesmo que poucos momentos em “Tudo Por Um Furo” sejam tão geniais quanto se espera de Will Farrell, a engenhosidade do ator e a arquitetura de seu humor multifacetado, que oscila numa linha tênue entre ironia, paródia e sutileza, cabem sim a ser compreendidos aqui. E é no limite entre a irreverência e o autocontrole dos absurdos tão engenhosamente explorados pelo cinema de McKay e Farrell que “Tudo Por Um Furo”, ainda que uma continuação decepcionante, continue sendo um grande filme da dupla.

 

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