Os textos de Shakespeare costumam ser à primeira vista tão complexos quanto intrigantes. No caso de “Macbeth”, também conhecida como ‘A peça escocesa’, não é diferente. Para realizar uma adaptação de uma peça de Shakespeare mais de cinco séculos após sua criação – e já com tantas décadas de versões cinematográficas dos seus grandes sucessos – é preciso trazer aquele algo a mais de expressão e autenticidade. 

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Na trama que leva seu nome, Macbeth (Denzel Washington) é um general que recebe uma profecia inesperada. Três bruxas o encontram a caminho de volta de uma batalha ao qual saiu vencedor e compartilham a visão que tiveram sobre o destino do general. Em seu futuro, uma ascendência na hierarquia que o levaria a ser Rei, ainda que a continuidade da monarquia viesse dos descendentes de Banquo (Bertie Carvel), seu amigo que o acompanha na jornada. 

Ainda que incrédulo de início, Macbeth começa a sentir a profecia cada vez mais perto de si. Assim, como que envenenado pela previsão – e claro, pelo poder e ambição instigados por tal, ele se une a sua Lady Macbeth (Frances McDormand) para traçar planos que garantam o concretizar da visão. É na visita do Rei Duncan (Brendan Gleeson) em sua casa que os devaneios se tornam ações e uma espiral de fardos e consequências leva a trama para os submundos de caráter e destino que Shakespeare aborda com tanta excelência – e por vezes, sutilmente nas incertezas e escolhas de seus personagens. 

Trago a trama com um pouco mais detalhe por um motivo. A experiência de “A Tragédia de Macbeth” é ainda mais proveitosa quando se tem conhecimento sobre a narrativa e as profundezas de seus elementos e peças. Ainda que com uma pesquisa prévia mais aprofundada a expectativa do que vai acontecer e as resoluções para cada personagem não sejam as surpresas excitantes que podem ser, assistir a essa adaptação enquanto se tenta acompanhar a trama pode ser um desperdício de deslumbramento do que a roupagem que a direção de Joel Coen tem a oferecer.

“A Tragédia de Macbeth” traz as tais expressão e autenticidade que queremos de uma obra de Shakespeare. Em sua fotografia, um jogo de sombras que remete a Ingmar Bergman e toda a escola do Expressionismo Alemão. Cenários minimalistas, grandes angulares e o uso do som e do silêncio fazem o necessário para sentirmos que tudo pode acontecer a qualquer momento e que, junto com os personagens, estamos no meio de algo que aparenta ser uma fortaleza, mas pode ruir e nos surpreender – de um jeito nada bom – a qualquer momento.

Da mesma forma, com a noção dos arcos de cada personagem, pode se tornar ainda mais proveitoso o se encantar com as interpretações entregues por Denzel Washington e Frances McDormand, que embarcam em uma visão bastante única de um casal tão icônico. Costumeiramente atuados com o visco e energia próximos ao lunatismo, aqui a linha do perigo está nas sutilezas. São elas que destacam o poder e o impacto contidos nas pequenas expressões e nas vozes quase silenciosas. Um sussurro imperdível em um universo intrigante de se entrar.

++Curiosidade: Você sabia que Lin Manuel-Miranda cita a peça ‘Macbeth’ e seus personagens Banquo e Macduff na música ‘Take a Brake’, de “Hamilton”?

“They think me Macbeth, ambition is my folly
I’m a polymath, a pain in the ass, a massive pain
Madison is Banquo
Jefferson’s Macduff
And Birnam Wood is Congress on its way to Dunsinane”

Música ‘Take a Brake’, de “Hamilton”

“A Tragédia de Macbeth” está indicado em três categorias no Oscar 2022: Melhor Ator, Melhor Fotografia e Melhor Direção de Arte. O filme já está disponível na Apple+.