“A diferença entre suspense e surpresa é muito simples, e costumo falar muito sobre isso. Mesmo assim, é frequente que haja nos filmes uma confusão entre essas duas noções. Estamos conversando, talvez exista uma bomba debaixo desta mesa e nossa conversa é muito banal, não acontece nada de especial, e de repente: bum, explosão. O público fica surpreso, mas, antes que tenha se surpreendido, mostraram-lhe uma cena absolutamente banal, destituída de interesse. Agora, examinemos o suspense. A bomba está debaixo da mesa e a plateia sabe disso, provavelmente porque viu o anarquista colocá-la. A plateia sabe que a bomba explodirá à uma hora e sabe que faltam quinze para a uma – há um relógio no cenário. De súbito, a mesma conversa banal fica interessantíssima porque o público participa da cena. Tem vontade de dizer aos personagens que estão na tela: ‘Vocês não deveriam contar coisas tão banais, há uma bomba debaixo da mesa, e ela vai explodir’. No primeiro caso, oferecemos ao público quinze segundos de surpresa no momento da explosão. No segundo caso, oferecemos quinze minutos de suspense. Donde se conclui que é necessário informar ao público sempre que possível, a não ser quando a surpresa for um twist, ou seja, quando o inesperado da conclusão constituir o sal da anedota.” Essa foi a resposta de Hitchcock para Truffaut quando perguntado sobre a diferença que se deve fazer entre suspense e surpresa. Também foi a questão que me pairou durante toda a sessão de “Golpe Duplo“, filme que nunca me deixa exatamente claro qual posição vai tomar em cada nova sequência (e isso levando em conta que a tradução do título é praticamente um spoiler sobre a narrativa).
Sem exatamente ser claro sobre ser uma espécie de whodunit, ou simplesmente um filme cujo plot não tem importância, e muito menos seus vários twists, “Golpe Duplo” já seria um péssimo exemplo de entretenimento porque os próprios diretores, Glenn Ficarra e John Requa, parecem mais preocupados em conceber um stylish estético e nunca entendem muito bem em qual sentido a narrativa vai percorrer junto de tal concepção. E, embora seja delicioso acompanhar a desenvoltura femme fatale-esque de Margot Robbie em cena, graças, acima de tudo, de seu carisma, o longa dos parceiros do ótimo “Amor a Toda Prova” esquece elementos fundamentais para o tipo de história que se pretende (e entender que o espectador não é estúpido é um desses elementos).
É num fetiche sobre a trilogia “Onze Homens e Um Segredo” com qualquer sub-filme que veio na onda dele, que “Golpe Duplo” se torna um desses exercícios preguiçosos, que se quer ser inteligente, mas acaba bem mais como uma tentativa frustrada de criar trucagens que sejam minimamente deliciosas de se acompanhar, principalmente por se tratar de criminosos impenetráveis em suas carcaças de perfeição egomaníaca.
Confira outras críticas do filme:
Crítica | “Golpe Duplo“, por Thiago Cardoso
Não deixe de conferir as novidades do CineOrna através das nossas redes sociais:
Facebook | Twitter | Filmow | G+ | Instagram | Tumblr | Pinterest | YouTube